sábado, 29 de novembro de 2014

epá, se ainda não viste, não leias isto


Boyhood começa da pior maneira possível, ao som de uma das piores músicas de um dos mais insuportáveis grupos de sempre, portanto, um dos maiores pedaços de merda já elaborados na história da Humanidade. A impressão é tão forte e douradora que durante para aí um quarto de hora há uma brisa irritante a percorrer-nos o corpo, e damos por nós só a admirar as mamas da Patricia Arquette ou a matutar no porquê do Linklater ser para os críticos americanos (e para o Rosenbaum) um dos seus realizadores preferidos, quando, aparte o Before Sunset (e aqui mais pela relação que estabelece com o primeiro filme, do que propriamente pelo valor em si), a sua obra só nos provoca encolher de ombros. Mas lentamente começam a surgir cousas bonitas...


... e um certo nível de torpor hipnótico começa a deixar rasto. Acumulam-se os pequenos-nadas, as grandes insignificações da vida, os acontecimentos banais e menos banais a ritmo regular e cuja sucessão é marcada por cortes que fazem serenamente passar anos em um segundo, sem separadores a marcar tempo. Há um desejo de identificação universal fortíssimo a pairar por aqui, e é por este ponto que os vilões poderão pegar para desbastar Boyhood: todos os acontecimentos que associamos a uma infância e adolescência "normal" estão presentes, sem deixar tempo e espaço para psicologias e catarses dos trezentos, no pior dos cenários, "manipulação ". Mas não queremos saber. Seguimos em frente. As mamas da Patricia vão descaindo ligeiramente mas continua uma belezura, a filha do Linklater começa a dar sinais de uma introversão comovente, e mais maravlhas nos vão presentar a acefalia...


...e fazem-nos admirar mesmo aqueles (breves) momentos tipicamente à Linklater, com diálogos sobre o sentido de "isto tudo", aqui inseridos sem causar distorção e indiferença. Nunca há rupturas, assaltos sonoros e de imagem, e quanto mais tempo passa mais o que ficou para trás ganha ressonância. A Patricia vai ganhando barriga, a filha do Linklater ouve Lady Gaga e pinta o cabelo, o Obama está prestes a ganhar, e vamos seguindo. Seguindo até ao fim, até esse sublime plano final, olhares e silêncios a pedir cumplicidade e planos para o futuro. Que o filme comece com uma das mais miseráveis cancões de sempre e termine com uma das melhores dos últimos , pra aí, vinte anos, não deixa de reflectir o lento mas crescente embasbacamento com Boyhood. Foda-se.


ps: Boyhood começou a ser rodado precisamente no mês em que o Sporting foi campeão nacional pela última vez.